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26ª Bienal
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Site da Fundação Bienal de São Paulo

Alfons Hug

Curador Geral

Biografia



Gostaríamos de saber qual sua posição em relação às questões da educação em torno da Bienal. Por exemplo, sabemos que o tema da democratização da arte é uma das bandeiras desta Bienal, cujo ingresso será gratuito. Como você acha que ela pode contribuir para a educação artística e estética do público?

Em primeiro lugar a arte, o ato criativo, é o que há de mais social e democrático que existe, independentemente do ingresso da Bienal ser gratuito ou não. Do ponto de vista conceitual e estético a comunicação entre a obra de arte, sobretudo a obra de arte bem-sucedida, e o público, é um ato de extrema democracia porque leva à construção de mundos paralelos e situações utópicas. Não tem nada mais político, nem mais democrático. Esta é a primeira coisa que reside dentro da essência da arte.

Já a questão da entrada gratuita tem de ser avaliada mais, digamos, do ponto de vista econômico. Certas camadas da população, como a classe média e os estudantes, não teriam acesso à Bienal de outra forma por causa da falta de recursos. Famílias com vários filhos, por exemplo, em que a visita representaria uma carga considerável no orçamento. Sobretudo se essas pessoas quiserem visitar a Bienal várias vezes, o que eu recomendo e acho que é necessário. Ela é muito grande – uma das maiores mostras do mundo – e tem muito material visual e plásico. Só os vídeos consomem um dia inteiro de visita se você quiser aproveitar todos eles.

Sabemos que o público da Bienal vem crescendo a cada nova edição e que a maior parte deste público vem das escolas, é formado por estudantes. Este é um dado muito significativo. Alfons, se você fosse professor de uma escola como prepararia seus alunos para uma visita à Bienal?

Eu espero que haja na escola uma preparação anterior à visita, em aulas de história da arte ou de arte contemporânea. Se existem, entre os alunos, artistas emergentes ou principiantes, isso é uma coisa boa; eles podem expor algumas obras e discutir sobre a questão da produção contemporânea, sobre estética.

Já no nível universitário eu recomendo uma abordagem através da literatura e da filosofia. A questão da estética quem melhor explica é a filosofia. E a questão da metáfora, que é fundamental na leitura da obra contemporânea, quem melhor explica é a literatura. Especialmente a literatura antiga – Dom Quixote, por exemplo, é um ótimo referencial para a leitura de uma exposição de obras contemporâneas.

Se os alunos forem muito jovens, já acho que uma abordagem através do impacto visual e plástico seria melhor que a filosofia. Mas também é muito difícil medir o efeito que isto provoca numa pessoa. A experiência estética é basicamente individual. Então, certas coisas nenhum professor vai poder explicar. Ele também tem que ter cuidado ao interpretar uma obra para os alunos. É uma entre várias interpretações possíveis. Arte não é ciência, não é nenhum evangelho. Ela tem várias verdades.

Quais questões, em relação à arte contemporânea, você acha importante discutir na escola após a visita dos alunos?

A primeira questão é: como o artista lida com os fenômenos da realidade, de que forma ele leva a matéria-prima do mundo real ao mundo da arte. Aí tem uma operação estética que faz com que o resultado, ou seja, a obra, não seja uma duplicação do mundo real, uma reportagem, mas um mundo novo. Isto sempre vale a pena ser discutido porque é uma questão filosófica. Por exemplo, o que um pedaço de madeira velha, que os artistas brasileiros usam muito, pode significar? Pode significar uma favela, mas esta seria uma leitura muito curta porque a madeira pode também significar muitas outras coisas, inclusive uma imagem abstrata, em função de sua textura, estrutura e colorido.

Em relação à produção contemporânea, podemos dizer que o artista apresenta a realidade de uma nova maneira?

De uma maneira alegórica. A alegoria é sempre uma metáfora, um símbolo. Uma coisa pode significar outra. Quando Dom Quixote vê o barbeiro com uma bacia de lata e diz ‘essa bacia de lata é um elmo dourado’ ele faz essa operação. Projeta uma outra finalidade para um objeto banal. A mesma coisa acontece na arte contemporânea. Qualquer pedaço de lixo, uma madeira, um material pobre pode ganhar um novo significado. Este é um assunto sobre o qual o professor deve chamar atenção – um objeto, uma obra, pode ter vários significados. O desafio é tentar interpretá-los.

A gente sabe, Alfons, que hoje o espaço da mediação entre a arte e o público tem merecido cada vez mais destaque nos museus e centros culturais. Não uma mediação apenas informativa, mas formativa, que ajuda exatamente a apontar para o público estas outras leituras mais densas. Em relação a esta questão da mediação, como você vê no papel do curador a dimensão educativa?

Eu fiz vários releases e dois textos para o catálogo, onde dou minha interpretação pessoal e subjetiva da mostra. Mas infelizmente compram-se poucos catálogos no Brasil...

Existem ainda textos sobre cada artista e a maioria deles não é escrito por mim. Nas representações nacionais, cada país tem um curador que escreve sobre seus artistas. Para os artistas convidados são outros os autores.

E pela primeira vez na Bienal haverá texto de parede sobre cada artista situando quem ele é, onde mora e o que é a obra. Vai ter também audio-guide. Desta vez o volume de informação aumentou em relação às edições anteriores. Dentro do possível fizemos tudo.

Mas no seu próprio trabalho, quando você discute a concepção da exposição, escolhe o tema, planeja o espaço e a distribuição das obras, você vê nessa sua atuação um caráter educativo também?

A priori não. O que rege a discussão do espaço são critérios conceituais, estéticos e técnicos. O técnico é muito importante, porque o ponto de partida é o prédio, que vem sendo estudado por nós há três anos. A dramaturgia da luz dentro dele, os seus vários níveis, a linha de fuga do Niemeyer, os diversos pés direitos... isto tudo determina a escolha da obra em um certo lugar. Por exemplo, uma escultura grande só pode ficar no térreo porque lá o pé direito tem oito metros. No segundo andar a parte de trás é mais escura, então coloco lá os vídeos. Na começo do segundo andar tem muita luz natural; lá ficam as fotografias e pinturas. Acho que isto também ajuda no processo educativo, mas sobretudo facilita a orientação do público em geral. Tomamos muito cuidado desta vez em facilitar a circulação, até porque haverá muitas visitas. O fluxo de público está bem organizado desta vez. As salas de vídeos serão amplas, com banquinhos para sentar e carpete. Não sei se isto é educativo, mas pelo menos facilita a vida de todo mundo.

 Facilitando a circulação e o acesso, facilita a leitura e redunda num espaço mais adequado para a apreciação. Isso acaba tendo um caráter educativo também ...

Mostra um certo padrão profissional e a função da Bienal é também influenciar outros museus e espaços culturais da cidade, mostrar como se apresenta arte contemporânea. Não quero dizer que não haja erros nesta mostra; falhas sempre existem. Mas desta vez a administração do espaço foi bastante pensada e acho que está bem-sucedida.

Sua experiência com a Bienal passada contribuiu neste processo?

É um processo de aprendizagem para todo mundo.

Bem, basicamente eram estas as questões. Nossa intenção era ouvir suas opiniões para levar aos educadores a sua visão, a preocupação da curadoria com a educação...

 Em geral o público brasileiro tem muita curiosidade. O percentual feminino é maior do que o masculino – algo em torno de 60% de mulheres. Quem carrega a Bienal, do ponto de vista da visitação, é a mulher jovem. Este é um fenômeno da América Latina em geral. Nos países espanhóis também; eu morei na Venezuela e Colômbia e lá também era assim. Às vezes a mulher leva o marido junto, ou namorado, mas é ela quem tem mais interesse.

Então não é muito difícil cativar o público da Bienal. Há uma abertura de espírito e uma vontade de ver coisas novas e aprender, o que é bastante positivo. [Voltar ao início] [Versão para impressão]

ARTISTAS
Beatriz Milhazes
Chen Shaofeng
Eduardo Kac
Esterio Segura
Ivens Machado
Luc Tuymans
Melik Ohanian
Paulo Brusky
Paulo Climachauska
Pablo Siquier
Rui Chafes
Thiago Bortolozzo
Vera Mantero
Victor Mutale
Xu Bing