Apresentação
Entrevistas
Biografias
Glossário
Bibliografia
Imagens
26ª Bienal
Ficha Técnica
Versão para impressão
 
Site da Fundação Bienal de São Paulo
Biografia

LUC TUYMANS

Biografia
Imagem da Obra
Sobre o artista
Sobre a obra
Leitura do artista


Gostaria que nos resumisse sua experiência profissional. Fale também sobre o trabalho que você apresenta na Bienal.

Sou pintor há 30 anos. Trouxe para a Bienal cinco pinturas de uma série de nove que ainda não estão prontas e que tratam de algo muito específico que acontece na Bélgica.
Primeiro o Alfons, o curador da Bienal, pediu-me para fazer algo sobre o Brasil. Mas eu nunca estive anteriormente aqui, essa é minha primeira vez. Achei incoerente fazer isso. Eu não sei nada sobre o Brasil exceto pelos clichês que conhecemos na Europa: futebol e carnaval.
Mas o interessante é que antes de participar dessa Bienal eu havia pensado em fazer uma série de trabalhos sobre o carnaval. Mas era sobre o carnaval que é realizado em um determinado lugar na Bélgica, uma cidade chamada Belge. Lá o carnaval é baseado em uma história mitológica. Como no Brasil, que esteve sob domínio português nos séculos XV e XVI, nós estivemos sob domínio hispânico. Um dos imperadores, Galaz V, nasceu em Flandres e no séc XV ou XVI ele, junto com seu filho, fez uma viagem pela região – na época a Bélgica ainda não existia – e descobriu um local onde viviam os parentes de Margareth da Bulgária e suas famílias.
E numa noite aqueles nobres homens vestidos de índios – porque estavam conquistando um novo mundo – deram laranjas uns aos outros. É baseado nesse mito que surgiu o carnaval de Belge.
Acho que naquele tempo a classe alta tinha seu próprio carnaval, como uma sociedade secreta.
Meu interesse era trabalhar com a idéia de que, mesmo vivendo em um mundo onde a mídia não é confiável, nós podemos voltar às antigas tradições ou tentar focar o folclore regional sob um ângulo diferente. E foi interessante pra mim criar aqui no Brasil uma espécie de paralelo ao remeter meu trabalho a algo ‘exótico’, incomum.
Assim, nas cinco telas que você vê há de um lado o desfile, onde esses chapéus de Flandres são usados... bom, o carnaval deles dura apenas um dia e começa quando saem todas as pessoas nas ruas. Os participantes precisam morar na cidade há pelo menos 10 anos; eles são levados pelas pessoas que tocam bateria a fazer um tour que começa as cinco da manhã, e há essa máscara para usar.
Lá pelo meio da tarde todos colocam fantasias e esse chapéu, que usam até a noite, junto com uns apetrechos nos joelhos que fazem parte da fantasia e que depois são queimados à meia-noite. É o ritual.[Voltar]

Eles mudam de roupa durante o dia?

Sim. Faz parte do ritual. Essa festa é protegida pela UNESCO porque é um carnaval muito peculiar. Eles também têm guizos que ficam pendurados nas roupas e nos pés.
E é claro que tudo é uma representação da cultura inca na Europa, que foi levada à universidade no século XIX e que depois tornou-se popular.

Vamos comentar sobre a sua técnica. O que é importante saber para entender seu trabalho? Porque sua pintura parece com surrealismo, parece desfocada, como uma situação mágica.

Bom, a parte desfocada não é como se fosse uma pincelada, existe um formato. É um movimento físico.
A idéia é trabalhar com tons e meios-tons porque isso cria mais profundidade. Também porque se você usa a cor completa o espaço fica bem mais delineado, esculpido, e na minha opinião a área de pintura não é para ser esculpida. Não acho bom memorizar as cores dessa maneira porque fica mais complicado para o visitante memorizar a situação inteira. Nesse caso ele terá que se aproximar mais da tela.
O importante do meu trabalho é que ele trata de representação de elementos, palavras. Primeiro eu penso sobre o que pintar e daí começo a procurar pelo objeto, faço vários desenhos, muita preparação, muitas tintas e fotos polaroids, o que seja, e depois eu decido sobre a imagem. A pintura em si é feita em um dia.[Voltar]

O que você gostaria de apontar para que entendam sua pintura?

Meu interesse com o público da Bienal, por ser um público grande, é ver o que eles irão reconhecer, mesmo que seja nuvens, ou se vão ver cogumelos... quero saber o que eles vão entender. Pode ser que vejam um grupo, não um desfile, se é que eles vão fazer uma ligação entre desfile e fantasias, que é uma implicação de carnaval. Mas a janela vai mostrar também que não é o carnaval daqui. As laranjas amassadas mostram a reminiscência de violência, o que aponta que o carnaval pode ser violento, como brigas de ruas.[Voltar]

É uma situação global.

Na verdade, a idéia é que o carnaval é uma forma anárquica de organizar o mundo, uma das últimas formas usadas e conhecidas de religião que sobrevive e ainda assim, especialmente no Brasil, é um fator importante na sociedade atual.
Eu não queria cometer o erro igual ao de Mathew Barney e fazer algo sobre o carnaval daqui porque não seria possível para mim; não o conheço. O que eu poderia fazer era trazer algo do meu lugar, com o qual fiz o paralelo, de uma maneira bem estranha e bem subjetiva.

Há várias camadas em comum.

Sim. E foi um jeito também de sair desse clichê exótico. Essa é a idéia, na verdade.

Há muito de visão política nessas pinturas. Caso perguntassem para mim o que vejo nelas, diria que não as vejo como símbolos de violência, religiosidade ou sociedade secreta, mas como um momento na sociedade em que a liberdade e a diversão surgem através de máscaras, rituais, da música.

E se eu entendi direito, o tema da Bienal é sobre território livre. Assim, nesse sentido, o carnaval é um território livre.

Uma parada no tempo, seja de um ou cinco dias.

E também em termos de pintura, que é outra zona temporal.

Nessa Bienal a pintura está privilegiada. O que você tem a dizer sobre pintura?

É muito idiota essa discussão sobre a pintura estar viva ou morta, porque não leva a lugar algum. Quero dizer que é melhor indagar sobre o que a pintura pode fazer. E mesmo quando ela não é o ponto central do mundo das artes, mesmo estando na área periférica, a pintura é muito importante porque os remanescentes são importantes.

É uma forma original de expressão.

Não. A pintura ainda é sobre ‘o traço original’, que é físico. É como fazer escarificações na pele. O gesto é outro elemento na pintura. Assim, ela é uma maneira de trabalhar e ler a imagem.
É claro que a pintura não pode ter apenas um caminho linear. Sempre houve grandes pintores e talvez seja por isso que ela nunca acabou. Porque basicamente as pessoas têm interesse nisso.
A controvérsia sobre esse assunto seria muito menor se não fosse por alguns críticos e curadores que determinam qual é a maneira certa do público olhar e também como devem entender o progresso tecnológico. Este deveria ser apenas visto como progresso.
Arte não é mídia. Claro que a mídia é importante, mas apenas se for usada de forma correta e específica para a criação de algo significativo. Isso em qualquer mídia.

A mídia é um suporte, não uma linguagem.

Isso. Não deve ser a razão da criação.
Bom, a maioria dos artistas que trabalham com vídeo e afins nunca me perguntou porque eu pinto.

Porque a pintura sofreu uma atualização. Você é um artista contemporâneo, com outro toque e senso.Diferente dos pintores dos séculos XVIII ou XIX, porque é outra visão de pintura.

É e não é. A pintura não mudou tanto assim, tecnicamente falando. As normas foram modificadas na mente.

Qual a mensagem você quer passar com seu trabalho?

A pintura é basicamente momento e precisão, que são os meus assuntos de estudo. Mas não menos importante é a idéia de transgressão da imagem cognitiva, e há muitas camadas que fazem relação com o histórico da pintura e com algo completamente banal, mas que se torna importante na hora que é pintado. Não sei se você percebe ou não o ritualismo específico que se materializa na pintura. É um prazer único. [Voltar ao início] [Versão para impressão]

ARTISTAS
Beatriz Milhazes
Chen Shaofeng
Eduardo Kac
Esterio Segura
Ivens Machado
Melik Ohanian
Paulo Brusky
Paulo Climachauska
Pablo Siquier
Rui Chafes
Thiago Bortolozzo
Vera Mantero
Victor Mutale
Xu Bing