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26ª Bienal
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Site da Fundação Bienal de São Paulo
   
 
 
   
Biografia PAULO CLIMACHAUSKA
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Sobre o artista
Sobre a obra
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Como você se situa como artista? Com que linguagens trabalha?

Comecei a expor com 28 anos de idade, há cerca de 12 anos. Venho desenvolvendo ao longo desse tempo uma série de trabalhos que podem ser estabelecidos dentro de uma certa tradição da arte brasileira, que é a arte construtiva brasileira, da qual eu sou herdeiro. Venho trabalhando ao longo desses anos buscando uma certa distensão deste processo construtivo e estabelecendo um certo diálogo com essa herança, mas sempre tentando pensar nestes processos dentro do contexto em que a gente vive hoje, dentro de condições das relações políticas, sociais, econômicas e históricas que a gente se insere hoje. Meu trabalho vem caminhando dentro desta discussão e ao mesmo tempo ele vem transitando sobre vários suportes. Trabalhei muitos anos basicamente com escultura, depois comecei a lidar com questões mais espaciais, instalações e hoje por conta do próprio conceito do trabalho estou me voltando cada vez mais ao bidimensional. Mas não é uma estratégia; pensando em termos de suporte, é só uma adequação do meio ao conceito.

Você falou que é herdeiro de uma tradição da arte brasileira. Como é que você percebe a contemporaneidade, essa atualização da arte brasileira dentro de seu trabalho?

Anos atrás, quando trabalhava com escultura ou basicamente instalação, estava preso à questão mais escultórica. Eu fazia alguns jogos construtivos, mas sempre tentando não reproduzir o passado, porque não tem muito sentido só se carregar uma herança e mantê-la, mas trazer um novo tipo de comentário a isso. Esse meu trabalho de escultura basicamente buscava uma certa distensão desse processo construtivo.

Seria uma herança da abstração e do concreto? Se focarmos essas duas vertentes da arte brasileira, vemos que a partir da década de 70/80 houve uma reavaliação desses processos e um esgarçamento de linguagens.

Exatamente. Eu ainda estava jogando dentro deste meio de campo e de uns três anos para cá comecei a desenvolver uma série de esculturas que leva a noção de subtração. O que passou pela minha cabeça, na verdade, refletindo um pouco sobre essa herança, o que me incomodava muito e me incomoda é que ela ainda existe, é viva e tem um sentido, mas havia um descompasso com relação ao tempo histórico, porque eu estava trabalhando com esta herança desde quando ela surgiu só que em outras condições sociais, econômicas, históricas, dentro de outra realidade. Esse descompasso me fez parar um pouco o que estava fazendo e iniciar uma inversão deste processo de construção. Enquanto estava buscando uma distensão nesse processo construtivo, a impressão que eu tinha é que estava lidando apenas com aspectos conjunturais: a estrutura continuava lá, eu apenas a distendia, não estava balançando-a... e passei para um caminho de tentar investigar qual era essa estrutura e tentar realmente criar um abalo nela. Daí veio a noção de subtração, uma inversão do processo construtivo onde você constrói subtraindo. Há uma relação, na verdade, dessa subtração com o discurso interno da arte. Este caminha em duas direções: a do discurso da arte-pela-arte e a do comentário mais político. Não estou só falando de política e nem só falando de arte; comento sobre o sistema interno da arte e, por tabela, os outros sistemas que existem no mundo.

Quanto ao seu trabalho apresentado na Bienal: você fala que voltou para o bidimensional e sua obra está dentro destas características.

Este trabalho não foi criado especialmente para a Bienal. Ele é um site specific que está dialogando diretamente com o prédio. Ao vê-lo, pode-se achar que ele foi pensado e construído especialmente para Bienal. Bem, em termos, porque na verdade já venho trabalhando há mais de um ano a construção, com subtração, de marcos da arquitetura modernista brasileira. Você pode ver a FAU na paralela (Paulo refere-se a seu trabalho, baseado no prédio da Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da USP, que está na mostra das galerias de arte de São Paulo, paralela à Bienal), eu fiz o Copan, tem vários outros prédios que eu andei construindo através de subtração. E o prédio da Bienal é um grande ícone da arquitetura modernista brasileira, então não é que fiz a Bienal porque estaria expondo esse trabalho aqui... lógico que também, mas ao mesmo tempo ele está totalmente inserido dentro da linguagem que venho desenvolvendo, que é essa construção com subtrações desses ícones da arquitetura modernista brasileira.

Sua formação é de artista plástico ou de arquiteto?

Sou formado em História. Na verdade eu trabalho com arte desde que me conheço por gente. Quando chegou na minha época de optar por alguma faculdade eu já tinha muitos amigos artistas, mais velhos, que estavam cursando Artes Plásticas. Mas não tinha interesse de fazer esse curso; não achava que ele era bom. Você ficava lá, lixando placa de cobre para fazer gravura, uma coisa totalmente técnica e eu não tinha o menor interesse nisso. Hoje as escolas estão mais preparadas. Eu queria buscar uma formação mais humanista, mais geral, e aí fui para o curso de História, que achei que iria me dar um embasamento maior. Mas eu nunca fiz curso de desenho; sou totalmente auto-didata.

Gostaria que você comentasse sobre o processo de construção de sua obra. Como você chegou nestas equações, nessas linhas?

Eu vim há alguns meses aqui no pavilhão da Bienal quando ele estava vazio e tirei uma foto da vista do pavilhão a partir da minha parede. Eu ‘escaneei’ a imagem e joguei-a no computador; ela foi trabalhada num sistema de arquitetura chamado AutoCad, que transformou a foto num desenho. Depois a gente ‘plotou’ a imagem em rolos de papel sulfite, no tamanho e na dimensão da parede. A partir daí nós passamos o desenho para a parede e aí viemos ‘subtraindo’ em cima. E a idéia é que ele é todo construído por subtração, mas tem uma lógica: cada linha do desenho, onde ela começa e onde termina, está ligada a um número aleatório, que vai sendo subtraído, e a linha termina em zero.

Mas foi no sistema do Auto Cad que você chegou nessa subtração?

Não, na verdade a idéia da subtração não advém de nenhum procedimento técnico, nenhum procedimento de feitura. Ela é puramente conceitual. É a proposta do trabalho, tanto que tive de adaptá-lo para esse conceito. Antes eu não trabalhava com a questão figurativa; meu trabalho era completamente conceitual, abstrato e escultórico. De repente estou ficando cada vez mais figurativo, cada vez mais representando o mundo.

Mas quando a gente chega perto da obra também acontece uma dissolução dessa representação.

Exatamente, é isso mesmo. Mas a brincadeira de você ser cada vez mais realista, figurativo, é exatamente assim, porque eu estou invertendo esta realidade. Estou construindo por um processo inverso, o de subtração. É um real invertido, um outro real. Daí vem a proposta de você mostrar que é possível você construir o mundo por subtração. Porque há duas ordens; a primeira é essa ordem interna da arte. Você tem uma inversão do processo de construção, então uma obra de arte opera por somas: é uma soma de materiais, de ações sobre o material, de pensamentos sobre esse material. E aí a brincadeira é você construir subtraindo. É puramente conceitual; eu estou somando, estou colocando tinta na parede, estou ocupando espaços, mas tem um desvio ali que você vê que é uma subtração. É uma brincadeira. Quando mais eu tiro, mais eu construo.

Você coloca a questão do desenho em seu trabalho com características peculiares, dando consistência, ampliando idéias dentro do desenho. É interessante mostrar, especialmente a educadores, que o desenho não é apenas um traço sobre uma superfície.

Com certeza. Esse trabalho denota que há uma outra possibilidade dentro desse desenho. Você o subverte e, ao mesmo tempo, como a coisa é construída com o mínimo de recursos, também estou usando a linguagem mais básica da arte, que é o desenho. A mais básica, a mais esquemática, a mais essencial. Então também é uma redução, de você trabalhar com o essencial mesmo, um traço na parede. Simples.

Quais os pontos de discussão sobre o seu trabalho que você realçaria para os professores?

Acho que minha obra aponta para esse pensamento sobre as possibilidades de construção de uma obra de arte. Ela aponta para uma outra possibilidade de se construir, invertendo esse processo de construção. Como é que você constrói subtraindo; como desenhar tirando? E por outro lado há o que eu já falei sobre o discurso interno da própria arte. O trabalho tenta subverter e inverter esse discurso. Existe também uma questão mais ampla, mais política, que é o diálogo que ele estabelece com o mundo. Quando pensei na subtração também pensei que esse é um discurso político, uma tentativa de você inverter uma certa noção economicista e fatalista que está tomando conta do mundo hoje, através desse processo neoliberal globalizante do capitalismo internacional. Hoje em dia o mundo está regido basicamente pelo sistema econômico, as relações são econômicas. Todas as outras relações, inclusive políticas, estão quase falindo em função de uma única diretriz econômica, a economia financeira que está se estendendo pelo mundo a ponto de estar apagando as expressões ideológicas. Ainda existem algumas válvulas de escape, mas é lógico que há esse pensamento dominante capitalista, que está operando somente pelo viés econômico e está entendendo que a gente só tem que pensar as nossas relações de vida, sociais, políticas, através da economia. Tanto que existe toda uma pressão econômica.
Na eleição do Lula havia um discurso financeiro internacional que se a gente votasse num presidente de esquerda estaríamos perdidos, porque as relações econômicas dominam e o Brasil iria afundar. Quer dizer, não existe nem aspiração de ter um presidente de esquerda, um presidente com uma preocupação social, porque o importante, o que rege o mundo, é a economia. Então existe um discurso político e existe uma tentativa de inverter e de dar uma guinada na estrutura desse pensamento.
Eu entendo que os sistemas que regulam o mundo, o sistema político e o econômico, são regidos pela soma. O sistema econômico é uma soma de bens e patrimônios, valores e tudo mais. De acumulação. E a base do sistema capitalista é a soma. E isso acontece com outros sistemas também; o sistema que legitima conceitualmente tudo isso é o sistema da história. Que também é linear, que opera pela soma de fatos, realidades, acontecimentos. Só que, se você atentar, essa soma é reduzida. Existem milhares de fatos esquecidos, histórias não contadas, vivências não registradas, então o sistema da história é uma ínfima soma para uma enorme subtração.
Você pega o sistema da arte, a história da arte, e é a mesma estrutura do sistema da história. É sistema de dominação. A gente que está no Brasil trabalhando com arte não pode ter a ilusão que estamos entrando na corrente da história da arte. Não, porque nós somos excluídos, subtraídos. É preciso estar atento a essa enorme subtração. No sistema econômico é assim também: são poucos que somam frente a uma enorme subtração.[Voltar]

Por que, dentro desse processo todo, você escolheu a arquitetura moderna como um ícone de representação?

Quando forjei essa idéia: ‘não precisamos pensar pela soma, podemos pensar pela subtração’, aí meu trabalho começou a ficar figurativo, porque me interessava representar o mundo construído por subtração e mostrar que ele poderia ser pensado e construído por outra forma. Então comecei a construir uma representação real do mundo, só que construí subtraindo. Comecei a trabalhar com paisagens, lugares do mundo. E na verdade a arquitetura é um lugar do homem no mundo, mas aí fiz um recorte da arquitetura modernista brasileira porque me interessa discutir o processo construtivo. E um período da arquitetura modernista brasileira, nos anos 50 e 60, quando ainda havia aquela idéia de que este seria o país do futuro, foi quando surgiu fortemente um pensamento construtivo. Mas esse não é mais o momento histórico que a gente vive hoje. Você tinha Brasília, uma nova arquitetura. Você tinha todo um projeto desenvolvimentista no Brasil e uma crença ingênua que estávamos inseridos no jogo do capitalismo internacional. E que a gente iria alcançar um lugar dentro desse jogo. Não temos lugar nesse jogo, por mais que a gente trabalhe. Então esse projeto faliu, mas essa arquitetura é maravilhosa...

A arquitetura moderna também vem da subtração do ornamento, da estrutura aparente...

Claro, há um processo de redução também, mas eu comecei a brincar com essa arquitetura justamente para inverter o processo construtivo. Porque lidar com arquitetura construtiva é quase que lidar com arte construtiva. A arquitetura tem um diálogo tão grande com a arte construtiva que busquei uma forma de lidar com as duas ao mesmo tempo.[Voltar ao início] [Versão para impressão]

 
   
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