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26ª Bienal
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Site da Fundação Bienal de São Paulo

XU BING

Biografia
Sobre o artista
Sobre a obra
Leitura do artista
 


Fale sobre sua carreira, sua formação...

Eu nasci em 1955 na China socialista e cresci em Pequim. Moro em Nova Iorque desde 1990.
Minha geração de artistas da China tem uma experiência de vida e de trabalho muito especial. A China é um país muito tradicional. A minha geração iniciou seus estudos durante o período da revolução cultural socialista. A tradição nacional ficou parada por Mao Tse-Tung. Podemos então dizer que minha geração teve uma referência cultural complicada. Nós temos dez anos de educação socialista, certo? E também dez anos de revolução e mais dez anos de pós-revolução, quando veio a quebra da cultura e as portas da China foram abertas verdadeiramente, o que permitiu a entrada da cultura ocidental.
Depois disso eu me mudei para a América e me envolvi no movimento de arte contemporânea ocidental. Com isso, foram diferentes camadas de cultura que influenciaram o meu trabalho.
E também meu trabalho é muito inserido na questão da língua. Veja, nessa peça eu uso muitas linguagens.[Voltar]

Linguagens diferentes, para trabalhos diferentes.

Eu sou interessado em línguas por causa do meu próprio contexto. Meus pais trabalham; minha mãe trabalha numa biblioteca. Quando eu era criança eles eram muito ocupados e, por isso, sempre me levavam ao escritório. Às vezes eles tinham reuniões no trabalho e me trancavam na biblioteca. Dessa maneira, ainda pequeno eu estava acostumado com livros, textos e letras. Ao mesmo tempo eu era tão novo que não podia lê-los.

Mas já estava acostumado com a imagem da escrita.

Isso. E foi assim que eu aprendi a ler... mas era a época que ninguém podia ler livros, apenas os de Mao. A nação inteira só lia aquele livrinho vermelho. Imagine o quão estranho era. Naquela época o governo me mandou para uma cidade do interior, onde eu aprendi bastante com os agricultores e sobre agricultura. Então, após este período, com as portas do país abertas, eu voltei para a cidade e muitos livros começaram a aparecer.

Muita informação.

Isso, muita informação, muitas atividades no país, literatura. Naquela época eu realmente li bastante. Foi quando eu comecei a me envolver com atividades nacionais, porque com as leituras eu passei a ficar incomodado... eu sentia raiva. Naquela época eu pensei muito no país, nas atividades dele, na língua, nesse tipo de assunto.

Eu vi um documentário sobre a arte chinesa contemporânea, que tem para mim uma situação muito similar à do Brasil, porque muitos jovens artistas possuem problemas para exibir seus trabalhos. E procuram por diferentes maneiras informais de exibição, usam casas e criam grupos para fazer isso. E há muita crítica política e econômica em seus trabalhos.

Na China, que eu saiba, há dois grupos: um que vive lá e outro que vive fora do país. Porém nós temos um contexto cultural semelhante. Os artistas que vivem fora, vivem entre duas culturas: a americana e a forte cultura chinesa. Dessa maneira, procuramos questionar sobre assuntos que coexistem nas duas culturas.
Eu mesmo procuro estudar as línguas, os erros e os mal-entendidos. Eu faço muitos trabalhos sobre esse assunto. E também olho para a tradição chinesa, que tem uma grande influência nas minhas obras.
Quando você vive na China, nunca está sensível para perceber a própria cultura. Mas quando você muda para outro país... você fica mais absorto e sensível ao seu contexto.
Eu acho que atualmente o importante para nós, artistas chineses, é como usar a nossa própria cultura, especialmente dentro da arte contemporânea.

Tem crescido há cinco anos o interesse pela arte chinesa contemporânea. Veja por exemplo a Bienal de Veneza. O que você acha desse movimento?

Creio que a arte chinesa contemporânea está em voga atualmente por vários motivos. Ela tem uma história curta. Começou muito tarde, mas está crescendo, desenvolvendo-se muito rapidamente.
O primeiro motivo, eu acho, é o país. É o desenvolvimento chinês.
O país está ficando rico, vem tendo atenção internacional. As pessoas querem realmente saber o que é hype na China nos dias de hoje. E a arte contemporânea consegue mostrar isso de maneira sensível.
As pessoas querem saber o que os jovens chineses pensam, quais são suas idéias. Eles querem ir atrás das artes. E também.... a outra razão... minha geração não tinha boas e formais informações sobre a arte contemporânea quando começou os estudos na área. E agora tem. Eu acho que isso é bom.

Existem questões sobre formas da arte contemporânea?

Sim. Por exemplo: eu fiz uma palestra – eu faço muitas palestras na América – onde o público perguntou sobre como encontrar aulas de arte tradicional chinesa e por que faço arte contemporânea. Eu me considero avant guarde. Eu respondo que é uma escolha.
Eu estava no interior quando minha geração começou e os americanos estavam em escolas de arte, falando e discutindo sobre arte contemporânea.
Eles aprenderam entre eles. Nós aprendemos com Mao Tse-Tung.
As idéias de Mao eram muito mais avant guarde que as dos garotos. Isso faz com que nós, que viemos da China, tenhamos um contexto realmente diferente e especial.

Você precisou fazer certas rupturas dentro de você, de sua cultura.

Você está certo. São tantas camadas de cultura com que lidar ao mesmo tempo e o espaço para o desenvolvimento do pensar é realmente grande.
Porque nós conhecemos a cultura ocidental, mas o ocidente não pode falar que nos conhece.
Artistas americanos conhecem sua própria cultura e trabalham dentro do sistema deles. Nós também, mas conhecemos outro sistema. Nós realmente misturamos. Acho que não seguimos caminhos formais. Assim, você pode dizer que o artista chinês contemporâneo cria trabalhos especiais.
E outra razão importante é que os grandes mestres da arte moderna e contemporânea são mestres zens.
Eles realmente agradam. Mesmo John Cale, Beuys, mesmo Andy Warhol, eles realmente entendiam sobre zen. Não importa se eles aprenderam zen budismo ou filosofia zen. A questão é que eles tinham um cuidado especial com o lado zen.
Nesse ponto o povo chinês pode dizer que entende mais sobre cultura zen. Ela é um estilo de vida, constrói personalidade e caráter mesmo que não seja aprendida em livros. Eu acho que o estilo de vida chinês é realmente zen, e artistas chineses sabem como usar isso na construção dos seus trabalhos.

Vamos falar sobre seus procedimentos. Qual o seu método de trabalho quando surge uma idéia?

Eu faço vários trabalhos usando a língua, porque para mim ela é muito importante.

A língua enquanto texto.

Isso. É realmente importante no meu trabalho porque a língua está sempre na base do meu conceito. Eu sempre brinco com esse conceito.

Ela é básica para o ser humano e faz parte de tudo, porque a atividade cultural está baseada no idioma. Assim, se você toca no idioma, está tocando as pessoas em suas vidas, em seus padrões.
As pessoas estão atreladas aos idiomas porque é a primeira coisa que aprendem. E se você muda algo na língua é um verdadeiro choque.
Mao Tse-Tung iniciou a revolução cultural primeiramente mudando a língua. Depois mudaram o sistema oficial da escrita.

Foi uma forma de controle.

Eles destruíram a cultura e o sistema para assim iniciar a revolução cultural. Por exemplo: no trabalho chamado “English write caligraphy” eu desenhei um tipo de escrita e caligrafia que parece chinês, mas é inglês.
Chineses não conseguem ler inglês, mesmo que o idioma possa parecer familiar.
E para os ocidentais a caligrafia chinesa é muito estranha e difícil, e no momento que tentam ler e escrever o fazem na própria língua.

É tão extraordinário que você tenha pensado nisso, porque a caligrafia chinesa está vinculada não a letras, mas a símbolos, e você usou formas semelhantes para criar isso.

Isso. Eu falei dessa obra para mostrar como o meu trabalho lida com conceitos. As pessoas sempre têm uma idéia sobre o idioma. O inglês é como se soletra. É escrito em linhas. O chinês parece com criptografia. As palavras são quadradas, parecem com pequenos desenhos. Mas para as pessoas lerem minha caligrafia elas precisam de um novo conceito. Porque esses dois não funcionam. É preciso construir um novo e esquecer os outros dois.
Eu estou sempre interessado em trabalhar entre um lado e outro.

O importante no seu trabalho é como ele será lido, uma vez que trabalha com a forma chinesa, mas sem que a escrita seja chinesa. É essencial a construção da frase e como ela será lida.

Isso. Talvez alguns chineses fiquem irritados por mudar o chinês para o inglês. Mas eles deveriam agradecer porque fiz isso.
Veja, essa caligrafia parece com a chinesa, mas na verdade é inglês.
[Começa a soletrar]
M A T T R - M Y W A Y
Eles lêem desse jeito. Isto é: A T T E R.
São tipos de palavras básicas para qualquer pessoa.

É preciso prestar atenção e mudar o jeito que lemos as palavras para entendermos o que está escrito. Mas isso é exatamente inglês.

É inglês com cara de chinês.
Esses foram usados em banners no MoMa, em Nova Iorque.
[Soletra]
A R T F O R P E O P L E.

E sobre a sua obra que está aqui? Existe o tema da Bienal, sobre o retorno da liberdade. Como você integra sua obra ao tema da Bienal?

Na verdade eu decidi usar essa obra sem saber o assunto e título da Bienal. Depois que li, percebi que se encaixava. Eu quis mostrar essa obra na Bienal, em São Paulo, porque... bem, é internacional a exposição, certo? E eu queria que o maior número de pessoas visse essa obra. Minha idéia é que elas atualmente precisam muito de trabalhos que as façam repensar as questões básicas. Eu acho que essa obra realmente toca, pega nesse momento.
Essa peça na verdade não fala sobre o 11 de setembro. Eu queria falar através dessa obra sobre o mundo material entre o mundo espiritual. Esse é o tipo de pergunta: o que é poder? Como as pessoas podem trabalhar juntas? Tipos diferentes de religião, culturas, tipos diferentes de grupo de pessoas. Por isso que eu acho essa obra hoje em dia é necessária.[Voltar]

Que pontos você considera importantes para o entendimento do seu trabalho?

Eu usei pó. Assoprei no ar e depois o pó grudou nos estencils que estavam no chão. Nós retiramos os estencils e ficaram as imagens das letras.
As formas das letras que estão no chão são do século VII, de um poema budista. São duas sentenças que dizem: “Nós não somos nada no inicio. Nós somos pó e o pó em si”. Esses são trechos do poema zen.
É uma idéia sobre o pó. Eu acho que é um pensamento bem chinês. Os chineses pensam que tudo veio do pó e que volta para o pó.
Provavelmente o ocidental, o cristão, tenha a mesma idéia.
Por que há palavras cortadas nas sentenças? Porque assim elas viram nada – e têm tanto poder quando estão estruturadas.
Eu realmente falo da estrutura e parto da matéria. O pó é um elemento básico. Nunca muda novamente. Por isso que é importante. Isto é verdadeiramente filosofia asiática. [Voltar ao início][Versão para impressão]

ARTISTAS
Beatriz Milhazes
Chen Shaofeng
Eduardo Kac
Esterio Segura
Ivens Machado
Luc Tuymans
Melik Ohanian
Paulo Bruscky
Paulo Climachauska
Pablo Siquier
Rui Chafes
Thiago Bortolozzo
Vera Mantero
Victor Mutale