Como você se situa enquanto artista?
Acho que sou um artista moderno. Na filosofia chinesa
de arte a “obra” é composta do artista, do trabalho
propriamente dito e do relacionamento com o público. A arte
contemporânea é uma arte conceitual e eu tento refletir
todas estas idéias. [Voltar]
Pintor, essencialmente?
Não acho que eu seja só um pintor. O material
que uso é de pintura, mas penso e faço arte moderna.
Não me importo com o que dizem sobre que tipo de artista eu
sou. Sigo o meu coração.
Como você se vê no
contexto do seu país
e da arte contemporânea hoje?
Vejo muitas notícias na televisão e nos jornais sobre exposições.
Acho que a arte moderna tem muitos estilos diferentes. Hoje, normalmente, as
pessoas acham que a arte ocidental é mais importante, mas não concordo
com essa visão. Artistas que fugiram da China para acompanhar a arte ocidental
não têm futuro, não irão muito longe. Cada país é diferente,
constrói suas próprias experiências, e sua arte também é diferente.
O meu trabalho também é assim; busco uma prática nova.
Novas maneiras de fazer
arte?
Isso, de inventar uma idéia nova. Artistas
modernos querem mostrar somente seus estilos próprios, querem
se mostrar. Ficam centrados em si mesmos. No trabalho deles a emoção
fica longe. Eles não se encontram na obra. Acho isso muito
chato, por isso decidi ir àquela aldeia chinesa fazer este
trabalho.
Quais as relações da sua obra
com o tema da Bienal, Território Livre?
Gosto deste trabalho na Bienal, mas não acho
que ele seja somente meu. É de muitos, pois em função
dele tive que mobilizar várias pessoas, chineses, camponeses.
Foi um trabalho grande. [Voltar]
Quantas pessoas?
Foram 500 pessoas. Mas na Bienal serão expostas
mais ou menos 100 pessoas.
Você pintou 500 pessoas no total?
Sim. Este trabalho é grande, e como envolve
muitas pessoas o poder da obra é grande. E ele não
trata só de arte, arte pura; esta é uma atividade social.
Acho que a pintura do camponês está no mesmo nível
que a do artista, não é diferente.
Como
você fez estes trabalhos? Vejo estes cavaletes
um de frente para o outro...
Em 1993 fiz um trabalho sobre camponeses somente com
desenhos. Antigamente, na China, o camponês não tinha
nenhum documento formal; só pessoas da cidade podiam ter documentos.
Queria que estes desenhos fizessem conexão com a questão
da documentação, demonstrando que o camponês é especial.
Então fiz com que os desenhos possuíssem todas as informações
sobre o retratado: imagem, nome, idade. Essa também é uma
coleção sobre a vida dessas pessoas.
Em 1996 retornei à mesma aldeia para expor os trabalhos. Queria ver se
a vida das pessoas retratadas havia mudado.
A arte moderna da China não se importa com os camponeses apesar de a China
ser um país agrícola onde 80% da população vive no
campo. Por isso acho muito importante retratá-los.
Na
China 80% da população é camponesa
e só quem vive na cidade tem documentos?
Hoje os camponeses têm, mas com dificuldade.
E nem todos os que moram na cidade têm documentação.
Quando comecei a pintar as pessoas tive de mostrar aos políticos
quem eram elas. No início os camponeses não entendiam
que eu iria fazer arte, eles não gostavam de mim (risos)...
Depois se acostumaram, passaram a gostar. E receberam minhas influências.
Você os
ensina a pintar?
Ensino aos jovens e também aos adultos que
têm interesse.
Você é professor
nestes momentos?
Meu tempo é dedicado principalmente à criação,
mas também já dei aulas.
Mas
ensina técnica de pintura, mistura de cores...
Sim. Em 1996 os camponeses começaram a pintar
as telas. Eles me desenhando, e eu a eles.
Simultaneamente, um de
frente para o outro?
Sim. Um sentava-se na frente do outro e começava
a pintar. Antes de 1996 só eu desenhava, aí pensei
nessa idéia deles me pintarem e assim começou o trabalho.
Foi um processo natural, espontâneo, uma forma de lhes “pagar
minha dívida”, de compensá-los pelo que eu aprendia
vivendo entre eles.
Isso
aconteceu com as crianças também?
Sim. Morei nesta aldeia bastante tempo e aprendi muito
com elas.
Qual o nome da aldeia?
Província de Hebei, cidade de Ding Xing, vila
de Tiangongsi.
Sobre
a obra que você está apresentando
na Bienal, quais questões este trabalho pode trazer para
ampliar a formação artística e a discussão
sobre estética em arte com o público, principalmente
o escolar, formado por crianças e jovens?
Acho que os visitantes terão de pensar sobre
a arte moderna. Já ouvi uma pessoa falar que passou a olhar
de forma diferente a arte, a China, depois de ver o meu trabalho,
que se baseia nos princípios da paz e da democracia. Mudou
a idéia tradicional do visitante.
As pessoas deveriam ter novas idéias sobre a arte moderna. Quero apresentar
novidades em meus trabalhos para o público. No passado só o artista
retratava, criava a partir da vida. Agora, através deste trabalho, as
expressões destas pessoas estão expostas aqui, nessa instituição.
Uma parte deste trabalho não foi feito pelo artista; foi produzido por
pessoas comuns. Então, para que precisamos de artistas agora? Atualmente
não precisamos mais deles, pois qualquer um pode pintar. Antes somente
o artista era “deus”, mas quero questionar essa idéia. Qualquer
pessoa também é “deus”. Quando a pessoa é influenciada
pelas idéias antigas, acha que o artista é “deus”.
Elas mudam de idéia quando percebem que também podem expressar-se,
pintar como o artista. [Voltar]
Agora você está pintando as pessoas
de São Paulo. Quem são estas pessoas?
São Paulo é um lugar que mistura todo
tipo de raça. É muito interessante. Brancos, negros, índios,
orientais... quero pintar todo tipo de pessoas aqui.
Onde você pretende mostrar
estes trabalhos? Já tem
previsão?
Vou pintar cerca de 20 paulistanos e fazer uma exposição
aqui na galeria da Rua Augusta, 664. Há pessoas que encontrei
na rua; outras vieram à galeria para fazer este trabalho.
As
pessoas estão pedindo para pintar?
Sim. Acho que diante da arte todas as pessoas são
iguais. Elas podem apreciá-la, ficar alegres. Antes, nas cabeças
das pessoas, os artistas ficavam no alto, eram famosos, distante
da vida dos outros. Eu agora quero me aproximar, reconhecer as pessoas
novamente. A pintura é um meio de expressão comum entre
nós. Essas pessoas também conseguem fazer coisas que
os artistas não conseguem. Quando elas terminam de pintar
e estão limpando o material, dão-se por satisfeitas.
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